domingo, 5 de janeiro de 2014

09/11/2013 - Sábado - Porto Nacional - Brasília

   Dia de passeio. A BR010 tem o visual de várias serras e da Chapada dos Veadeiros. Segui viagem contornando os morros e desviando das chuvas, escapa daqui e dali e cheguei seco em Brasília.


 Primeira parada em Brasília para agradecer a boa sorte!


FIM

08/11/2013 - Sexta-Feira - Imperatriz - Porto Nacional

    Tomei meu café da manhã e voltei para a estrada para o trecho mais movimentado da Belém-Brasília. Esse foi o dia mais estrada-cansativa da viagem, vários trechos estão em obras. Fui seguindo meu ritmo e no final do dia deixei a Belém-Brasília para entrar na BR-010. Trata-se de uma opção com muito menos tráfego e com um lindo visual.

    Mais uma vez optei por não entrar em Palmas e segui direto para Porto Nacional. Ótima escolha. A cidade é muito acolhedora e ainda tive tempo de tomar um banho na prainha da represa da usina do Lajedo.



07/11/2013 - Quinta-Feira - Belém - Imperatriz

    Acordei não muito cedo, tomei meu café da manhã e me despedi dos meus anfitriões. Hora de voltar para estrada. Depois de quase uma semana navegando estava sentindo falta de rodar, acelerar minha moto, primeiro rumo leste até Santa Maria do Pará, depois rumo sul, direto para Brasília. Mas não tão rápido, com 3 dias para rodar os 2100km deu tempo para curtir um pouco.

    Cheguei a Imperatriz no final do dia, hora do rush. Nossas cidades cresceram demais. Muitos carros e motos, falta rua, falta calçada, falta tudo, até vaga em hotel. Acabei me hospedando perto da antiga rodoviária. Lugar simples mas com garagem e um banheiro pitoresco. Saí a noite para jantar na beira do rio.


06/11/2013 - Quarta-Feira - Belém

    Tirei o dia para colocar algumas coisas em ordem e dar uma passada no banco recompor o caixa. Belém tem algumas peculiaridades. Por exemplo, na saída do banco você pode comprar um quilo de camarão por 20 reais e preparar um petisco para a hora do almoço. E foi o que fizemos!


    A noite visitei a família da Rita, amiga da Nazaré e minha amiga deste 2010 quando passei em Belém vindo do Monte Roraima. Sempre me aguardam com um cafezinho e uma boa conversa com suas filhas Rebeca e Elizabeth.
   Mais tarde encontrei meus amigos Luciléo e Lucivan num espetinho e assistimos ao jogo do Flamengo, claro que eu sequei, rubro-negro comigo não tem vez. (risos)

05/11/2013 - Terça-Feira - Manaus - Belém (Chegada)

    Chegamos à Belém já à noite. Apesar de ter curtido cada momento no barco, já sentia nas costas a necessidade de dormir numa cama, e cama em Belém eu tenho uma sempre me esperando na casa da Nazaré e do Painho. Mais uma vez liguei para eles informando que chegaria tarde, mais uma vez me receberiam. Me despedi dos amigos do navio, alguns ainda dormiriam embarcados, retirei a moto do convés inferior. Maré baixa, pranchões de madeira, barco afastado do cais, sempre do jeito mais emocionante. Carreguei minhas coisas e tratei de sair do porto. Alguma burocracia. O pessoal do navio não registrou o transporte dos veículos. Tive que falar com o administrador de plantão para me liberar. Talvez ele tenha visto algo de insatisfação no meu semblante e liberou logo minha saída. Pronto, ganhei a rua e segui direto para casa dos meus amigos.

2 a 4/11/2013 - Manaus - Belém (Os dias no navio)

    Não imaginem o meu navio como um transatlântico, no Norte 'navio' é como são chamados os barcos de ferro ou aço. Se for de madeira é barco mesmo. A primeira providência ao embarcar é armar sua rede. Eu prefiro o espaço aberto, sem ar condicionado. Também é importante ficar longe dos banheiros e do bar do navio. Eu havia ido até o barco bem cedo no dia da partida para  reservar meu lugar. Quando voltei, dois jovens estrangeiros haviam movido a minha rede e me espremeram. Fiquei pau da vida. A rede de cada um é sagrada , não se mexe. Mudar de local então?! Ofensa gravíssima. Eu não conseguiria viajar ao lado dos tais, ainda mais que reclamei e fizeram cara de desentendidos. Peguei minha rede e mudei para uma vizinhança melhor, ao um lado um casal que estava mais “interessado” um no outro e de uma turista da Áustria, a Anna. A Anna acabou sendo minha companhia em praticamente todas as refeições. Interessante a disposição dela algum tempo atrás veio ao Brasil numa viagem em grupo, gostou do país e decidiu voltar sozinha. Falando pouquíssimo português, estava feliz da vida dormindo em hotéis de selva, albergues e rede. Gosto do espírito jovem, afinal estou nessa também!


    A rotina do navio é acordar cedo, não tem outra forma, o pessoal começa a se movimentar logo que o dia amanhece. É servido o café da manhã, que neste navio é pago, (normalmente o café é grátis). Depois rola mais uma preguiça na rede. Levanta-se e sempre se encontra alguém para conversar. No dia da partida encontrei dois amigos paranaenses de Coronel Vivida, O Luciano e o Wagner. Viajavam de camionete e como eu, só conseguiram embarcar o carro a noite. Mas é claro, a noite fica mais emocionante, parece que tudo nesses portos é feito do jeito difícil.

    Durante a noite já trocamos umas informações, eles fariam a Transamazônica até Marabá, um trecho que estava nos meus planos, mas que desisti após ver a previsão de chuvas para a região. Durante os três dias que navegamos até Santarém conversamos muito. Bons companheiros e amigos de estrada, ou rio. Nas nossas rodas de conversa estava também um casal de italianos de Cremona, a Nirmy e o Federico. Uma característica dos mochileiros mais jovens é fazer tudo da forma mais barata para poder ficar mais tempo viajando. Um exemplo, estavam no Pantanal Sul e para chegarem ao Amazonas tomaram um ônibus na Bolívia por ser mais barato. Eles contaram que a viagem foi muito desconfortável, mas que valeu a pena! Quando desembarcaram em Santarém eles seguiriam de carona com nossos amigos na camionete.

   A partir de Santarém os amigos se renovaram. Continuei com a companhia da Anna nas refeições e juntou-se a nós a Pauline, jovem holandesa que estava no fim de uma viagem de um ano pela América do Sul. Para viajar sozinha esse período economizou dinheiro trabalhando no McDonalds. Muito divertida e despachada com muita experiência em mochilão pela idade que tem. Conversamos muito, tanto que perdi a voz no final do dia. Nas novas rodas de conversa ainda participaram a Flore, da Bélgica, também viajando sozinha, estava vindo de Iquitos, Peru, pelo rio Amazonas e o Paulinho, trabalhador da Petrobras, gente finíssima, aproveitava a folga da escala para visitar a família. Estes foram alguns passageiros com quem passei mais tempo, mas haviam muitos outros. Um senhor que acabara de separar da mulher e o assunto era só esse. Outro que fora a Manaus atrás de documentos necessários para sua aposentadoria e estava completamente desprovido de recursos, tanto que o Paulinho organizou uma vaquinha e ainda apadrinhou ele no navio para que fosse respeitado pela tripulação. Muitas histórias que se passam num ambiente confinado com pessoas completamente diferentes, mas que de alguma forma trocam algo, deixam uma palavra, um sorriso ou um olhar, experiência para a vida.



01/11/2013 - Sexta-Feira - Manaus - Belém (Partida)

    O horário de saída do navio estava marcado para 14h. Tinha tempo de me organizar. Comprei alguns itens de higiene, uns biscoitos, caderno para anotações, tudo para melhorar a vida a bordo. Almocei pouco antes do meio dia. Obviamente, num ótimo buffet por quilo  com churrasco. Não há restaurante melhor no mundo. Pelo menos no mundo que eu conheço. Segui para o porto e lá estava o navio, vi minha moto ainda no cais, o navio cheio de cebola e farinha. Seria uma longa espera. Partimos quase nove horas da noite.



31/10/2013 - Quinta-Feira - Presidente Figueiredo - Balbina - Manaus

    Interessante como acordo cedo nas férias. Antes do café da manhã fiz uma caminhada na beira do rio, voltei ao hotel. Fiz meu desjejum e ganhei a estrada com destino à Balbina, a usina hidrelétrica que é considerada um desastre ecológico, mas que está se tornando um famoso local para a pesca do tucunaré. Cheguei às margens do lago da usina no meio da manhã e me instalei no único restaurante que ali existe. Em pouco tempo eu já estava banhando nas águas quentes do lago, uma delícia de banho. Almocei uma porção de peixe frito a um preço justo e segui novamente para Presidente Figueiredo a fim de abastecer a moto e seguir viagem para Manaus.


    A chegada em Manaus é sempre caótica, trânsito confuso, motoristas imprudentes e apressados, nenhuma sinalização e no meio dessa esbórnia os pedestres balançando a mão para os carros pararem na faixa de pedestres. Peço desculpas à todas as solicitações que não atendi, mas eu que não queria ser abalroado por ser gentil. Nessa tensão e atenção segui direto para o porto. Parei em frente à calçada onde ficam os vendedores de passagens e fui informado que havia um navio partindo no dia seguinte para Belém. O nome era bonito: Liberty Star. Comprei as passagens para mim e para a moto e segui para o porto com a esperança de embarcar a moto no mesmo dia. Cheguei no navio e descobri que ele estava carregado de farinha, cebola e tomate. Como só carrega depois que esvazia, esperei um pouco, aí choveu e parou o descarregamento de vez. Deixei as chaves com o responsável pelo carregamento e fui para um hotel. Precisava dormir em uma cama antes dos cinco dias de viagem pelo Amazonas.

30/10/2013 - Quarta-Feira - Boa Vista - Presidente Figueiredo

    Tomei o café da manhã sem pressa, afinal não iria a lugar algum sem minhas roupas, principalmente a calça e a jaqueta de pilotar. Durante minha operação tartaruga chegou a roupa, limpinha e cheirosa, inacreditável, ótimo serviço. Quem observou meu estado nas fotos do dia anterior pode imaginar o trabalho que deu lavar essa roupa. Bagagem arrumada, tudo pronto. Eu estava até me achando bonito, tudo limpo, brilhando. Despedidas no hotel e ganhei o rumo da estrada, BR 174. Parei para abastecer em Caracaraí e no posto de gasolina conheci o Pássaro, motociclista baiano que está na estrada sem data para voltar, gente boa, vai viajando e visitando amigos por todo lugar. Trocamos contatos, tiramos uma foto e nos despedimos, pois ele seguia para Boa Vista. O dia foi esquentando e pelo meio dia parei em Rorainópolis para almoçar ao estilo brasileiro, buffet por quilo com churrasco na Churrascaria Maringá. Muito simpáticos meus conterrâneos de estado e a comida muito saborosa. Tomei um cafezinho, descansei mais uns minutos e encarei a lua lá fora. Calor gostoso, pelo menos para mim. Passei novamente pela linha do Equador que dias atrás havia cruzado em Macapá. Parei para fotos e uma bem vinda água de coco gelada. Conversei um pouco com o rapaz da banca , descobri que havia um posto de gasolina logo antes da entrada da reserva indígena. A BR 174 tem 120 Km dentro de uma reserva indígena onde não há qualquer ponto de apoio e aconselha-se não parar desnecessariamente. Fiz conforme planejado, enchi o tanque e entrei na reserva indígena. Com árvores altas fazendo sombra, a estrada tem um clima fresco e muito agradável para pilotar. Também recomenda-se que não se fotografe dentro da reserva. Não vi ninguém às margens da rodovia durante toda a travessia. No final da tarde estava em Presidente Figueiredo, me hospedei no único hotel dentro do complexo turístico da corredeira de Urubuí a tempo de um banho de rio. Presidente Figueiredo é uma cidade inflacionada pelo turismo. Por muito tempo foi a única opção para passeios via terrestre a partir de Manaus. Pelo menos no hotel e no restaurante onde jantei o preço é elevado para o nível de cordialidade e qualidade no atendimento ao cliente.


29/10/2013 - Terça-Feira - Annai - Boa Vista

     Acordei até mais cedo do que o necessário, dia de fronteira sempre exige um tempo extra. Aproveitei para caminhar pelo lugar e tirar algumas fotos. Tomei o café da manhã e me despedi da equipe do Rock View . Rodas na estrada. Neste trecho aparecem algumas fazendas e encontrei alguns caminhões transportando pessoas, provavelmente trabalhadores rurais e também estudantes. Mantive o costume de fazer muitas paradas para beber água, apesar do clima agradável desse dia, temperatura amena. A paisagem me distraiu tanto que de repente apareceu  uma placa “Bonfim 5 Km”.  Gritei dentro do capacete comemorando o final da etapa mais desafiadora da viagem, em 5 Km estaria novamente no Brasil.


   Logo cheguei ao asfalto e a Lethem, última cidade da Guiana. Fiz a saída da moto e carimbei o passaporte. Vendi meus últimos dólares guianenses e segui para a ponte que liga os dois países. Passei pela famosa estrutura que inverte a mão inglesa e voltei a rodar pela direita da pista. Na aduana brasileira, nada a declarar, parei pouco à frente para trocar as pilhas do GPS. Veio falar comigo o Diego, motociclista também, me indicou o Hotel Magna em Boa Vista, suspeitei que era o mesmo que eu já havia me hospedado em 2010. Cheguei em Boa Vista, e de memória encontrei o hotel, bingo, esse mesmo. Hoje o dia rendeu, ganhei mais uma hora no fuso. Instalei-me no hotel Magna e comecei a operação limpeza. Fiquei somente com roupa do corpo, a mais limpa que havia, e o restante foi para a lavanderia. Almocei perto do hotel, num típico quilo com churrasco brasileiro. A tarde eu dediquei à moto. Uma boa lavagem, uma câmara nova para o pneu dianteiro e troca de óleo. Voltei para a pousada para terminar a limpeza, lavei as botas e a bagagem que pegou pó. Deveres cumpridos sentei na lanchonete do hotel para tomar um suco e bater  um papo. Conheci dois fazendeiros do Paraná que estavam lá visitando terras para comprar. Parece ser um bom negócio. O jantar foi numa pizzaria perto do monumento do 3º Milênio.



28/10/2013 - Segunda-Feira - Iwokrama - Annai

    5:45 da madrugada, ponto de encontro no refeitório, uma xícara de café e um biscoito e estávamos prontos, eu e o Wayne, para seguirmos nosso guia, o John, num passeio pelas passarelas suspensas em busca das aves da Guyana. Adentramos na mata e o John foi discorrendo sobre as árvores do caminho e permanecia atento à algumas aves que já apareciam. Não mencionei antes, mas esta região é um paraíso para os avistadores de pássaros,  essa é a principal atividade e o interesse dos turistas que aqui se hospedam e visitam a região. Eu gosto de pássaros, mas também queria conhecer essa infraestrutura que foi projetada e doada pelos canadenses. O nome é Iwokrama Canopy Walkway. Trata-se de uma passarela que está ancorada em quatro grandes árvores à altura de 33m. Em cada árvore há uma plataforma circular onde o visitante se acomoda à espera dos pássaros. Os guias ouvem os cantos e apontam binóculos e lunetas para que possamos vê-los. Todas as avistagens são anotadas num diário. Observamos alguns pássaros e voltamos ao refeitório para o café da manhã. No caminho de volta o John me mostrou uma pequena toca perto do tronco de uma árvore, imaginei que seria de uma aranha, mas me surpreendi ao ver um caranguejo. A quase 400 Km do mar, em plena floresta existem caranguejos. Isso foi novidade! Pouco mais à frente encontramos um veado, acostumado com a movimentação do local ficou por ali enquanto eu tirava fotos.

    Voltamos ao refeitório para tomarmos o café da manhã a tempo de nos despedirmos do motociclista suíço que estava de partida para Boa Vista. Depois do café aproveitei o tempo livre para dar uma geral na moto e principalmente consertar a câmara furada no dia anterior, assim teria novamente uma câmara reserva para encarar o restante da estrada até Boa vista.


    Antes do almoço ainda tive tempo de fazer uma caminhada no meio da mata para tentarmos flagrar mais um pouco da fauna local. Sem sorte com os animais voltamos para o refeitório. Após o almoço arrumei minhas coisas, me despedi da simpática equipe do Atta Lodge e segui viagem.

    
    Para hoje pouca estrada , planejei um dia tranquilo e meu objetivo era dormir no Rock View Lodge distante cerca de 45 Km. Clima agradável, dia ótimo para passear, logo chegava ao meu destino. Deixei minhas coisas no quarto e me aprontei para mais uma caminhada, agora o cenário mudou, estava na Savana. Em companhia do guia, saí da pousada em direção a uma pequena montanha de onde se tem uma vista da planície ao redor. Essa área de Annai inunda no período das chuvas e por vezes fica isolada, pois a estrada desaparece sob a água. Voltamos pouco antes do por do sol. Jantamos no refeitório em companhia do filho do fundador da pousada e de outro turista que eu já havia conhecido naquele mesmo dia bem cedo nas passarelas do Ivokrama Canopy Walkway. Conversamos um pouco, mas fomos dormir logo, todos acordariam muito cedo no outro dia. Marquei meu café da manhã para às 6h e me lancei à cama sob um belo mosqueteiro, obrigatório nessas paragens.


27/10/2013 - Domingo - Georgetown – Iwokrama

      Você já sabe, acordei cedo, carreguei a moto, tomei café e pouco antes das seis horas  ouvi o barulho da moto do Clyde. Saímos em direção à Linden. Uma maravilha não me preocupar com o caminho, alias não vi uma placa indicando a cidade de Linden. Deixamos Georgetown e seu trânsito caótico para trás e por uma boa rodovia asfaltada chegamos a Linden. Paramos para tomar uma Coca-Cola após a ponte, que cobra pedágio, conversamos mais um pouco, o Clyde me perguntou: “Mas não aconteceu nada nesta viagem? Nem um pneu furado?” respondi: “Nada, uma maravilha”, e batemos 3 vezes na mesa. Seguimos até o trevo onde nos separaríamos, mais uma parada para fotos e uma videocassetada, o descanso da minha moto afundou na areia e ela tombou. O Clyde ainda tentou segurar, mas não teve jeito. Tudo registrado pela câmera que já estava posicionada e com o timer ligado, levantamos a moto, pesada com toda a bagagem e gasolina reserva. As proteções instaladas evitaram maiores danos, apenas uns ralados e nada mais. Nos posicionamos novamente e fizemos a foto. Nos despedimos, agora era eu comigo mesmo.

    Eu tinha gasolina, comida, uma moto preparada, peças sobressalentes e muita vontade. Interessante como pouco antes da viagem e até mesmo no início dela eu estava muito ansioso e receoso, agora tinha ganhado confiança, me encontrava no trecho mais desafiador e estava muito tranquilo. Iniciei sentindo o terreno, no início a estrada era larga, os carros e caminhões fazem uma trilha sinuosa buscando o melhor caminho. Em Georgetown eu tinha falado com os motoristas de van que fazem o trajeto. Eles me contaram que a estrada estava seca e eu estava muito feliz por constatar que era verdade. A estrada alterna todo tipo de piso, pedras irregulares, pedrinhas redondas, areia, costelas de vaca, buracos, as vezes tudo isso junto em plena curva. A moto não gostou das costelas de vaca, parei e murchei os pneus, ficou ótimo, pelo menos por enquanto! Fui parando frequentemente. Comi um pão e uma banana no meio da manhã, tomei muita água. Tinha preocupação em me manter bem alimentado e hidratado, o dia poderia ser longo.

 
    Cruzei com muitas vans e camionetes, todos andavam mais rápido do que eu, exceto alguns caminhões carregados. Durante a manhã a estrada esteve bem movimentada e na maioria das vezes em que parei para comer, beber ou tirar fotos e passava algum veículo este diminuía e esperava algum sinal, eu mandava um positivo e ele seguia viagem. Existe uma solidariedade entre os viajantes nestas remotas paragens. Pouco depois das 11:30h cheguei num ponto chamado Mile 58. É um bom ponto de apoio com restaurante, posto de gasolina, borracharia e uma igreja onde acontecia um culto naquele momento. Completei o tanque da moto e almocei arroz com frango frito. Um Surinamês numa camionete que encontrei  o tempo todo na estrada veio falar comigo, apresentou sua irmã. Ele estava com três moças no carro, queria que eu levasse uma. Dessa vez dava jogo, gostei das gurias, mas vida de viajante não é fácil. Tenho que seguir os planos... Elogiei todas com merecidos comentários. Eles partiram e eu continuei solteiro. Veio falar comigo uma mulher, paraense de Paraubebas ,  gostou da moto, que fez ela recordar da sua, igual a minha que fora roubada. Espero ter melhor sorte! Ela estava chegando de carona, trazia um pneu furado para conserto. Pediu para que eu desse um recado para o homem que ficou na camionete azul, que estava parada depois da travessia do rio: “Ela mandaria o pneu no 1º carro que fosse naquela direção”. Da forma como ela falou parecia logo ali. 2 horas para frente disse ela. Renovado com a meia hora de descanso, subi na moto e segui viagem.



   Mais um pouco de estrada, 23km, e cheguei a Mabura Hill, parei no posto de controle e aguardei o policial voltar do almoço para registrar minha passagem, apesar de haver uma mulher no local que dizia não ser necessário o registro. Mas li relatos de viajantes que tiveram que voltar todo o caminho para fazer o registro que não haviam feito. Eu que não me arriscaria, estava preparado para uma viagem de ida somente.


    Segui viagem contemplando a mata e desviando dos perigos. Cheguei na balsa para travessia do rio Essequibo pouco antes das 4 horas da tarde. 323Km rodados em 9 horas, média de 35km/h. Motos só atravessam na balsa se houver algo maior junto, como um carro ou um  caminhão, eu sabia que vinha um caminhão atrás de mim, então  estava tranquilo. De qualquer forma o funcionário da balsa pediu para embarcar a moto porque eles atravessariam o rio para buscar outro caminhão na outra margem. O caminhão que vinha atrás logo chegou e a balsa partiu carregada.



  Às  4:20 toquei a margem sul do Essequibo e segui para o posto de controle que há logo em seguida. Anotaram minha passagem em dois livros. Neste ponto da estrada e imediatamente antes da balsa existe apoio, lugar para ficar e dormir. Na margem sul do rio existe um Lodge bacana, Iwokrama River Lodge, com chalés com vista para o rio. Confesso que fiquei tentado, mas como imaginava que no máximo em 1 hora chegaria ao lugar planejado para pernoite, o Atta Lodge, continuei para a última etapa do dia. O tempo foi passando e nada do lugar, imaginava que estaria a uns 25 Km do rio. Estava chegando perto dessa marca, 5 horas da tarde, quando a roda dianteira acertou um buraco na estrada com mais força. A gente sabe quando a moto não gostou do buraco, diminui a velocidade e esperei para sentir o comportamento da moto, não demorou a frente começou a dançar mais que rainha da bateria de escola de samba. Parei e fui verificar o que tinha acontecido: aro e raios intactos, pneu murcho. Maravilha, hora de colocar em prática tudo que havia treinado mentalmente. Estacionei a moto na beira da estrada. Bebi água, coloquei meu chapéu, descarreguei tudo, calcei a moto com o bauleto, e com a frente suspensa retirei a roda para conserto. Usei pela primeira vez as espátulas para desmontar o pneu. Não perdi tempo procurando o furo, troquei logo a câmara por uma reserva. Agora era a hora de encher o pneu com a bomba de ar da minha bicicleta. Após 200 bombadas, 15 libras, opa, funciona, mais 100 bombadas, pronto 20 libras. Montei tudo novamente e com um pitstop de menos de meia hora já estava pronto para seguir.



   Comecei a pilotagem bem devagar e com muita atenção até sentir confiança no meu trabalho. Em pouco tempo encontrei a camionete azul que aguardava o pneu que foi levado para consertar. Parei e dei o recado para o homem que lá aguardava. Àquela hora talvez não aparecesse mais ninguém e ele passaria a noite na estrada. O tempo em que conversamos foi o suficiente para escurecer. Noite sem lua no meio da floresta, acredite, é escuro pacas!



    Entrei na estradinha de acesso com todo cuidado e segui até o estacionamento. Já havia uma moto de outro viajante, me senti bem, ali havia outro como eu. Desci da moto e caminhei até a recepção, eu ainda estava um pouco adrenalizado . Fui recepcionado pelo Leon que me atendeu com muita educação e perguntou quais meus objetivos ali, ao que respondi: “Neste momento, tomar um banho, jantar e dormir.” Ele confirmou com a cozinheira se haveria comida para mais um hóspede e comunicou o preço da diária, 180 doláres, agradeci mentalmente não ter gasto esse dinheiro no passeio de avião para Kaieteur Falls, e disse:”ok!”.
    O valor da diária incluiu o jantar, café da manhã, almoço, uma visita à passarela de observação de pássaros e outros passeios pelas trilhas da mata. Fui apresentado aos outros hóspedes, um suíço que estava de moto, e um canadense que estava lá prestando uma consultoria voluntária sobre como gerenciar o hotel e receber os clientes. O Leon me mostrou o quarto, voltei e fui pegar as coisas na moto, o canadense se aproximou e chamando pelo meu nome perguntou se eu precisava de ajuda. Que vergonha , naquela agitação da chegada não memorizei seu nome e ele foi extremamente gentil. Agora sei, é Wayne e é um gentleman. Agradeci, mas estava descarregando apenas o baú. Fui para o banho sob as estrelas, sim sob as estrelas, o chuveiro não tem teto. Me sentindo um ser humano mais limpo e agradável fui para o refeitório onde o jantar nos aguardava. O Leon explicou que seria um jantar com 3 pratos e descreveu cada um deles antes que nos servissem, impecável. Durante o jantar conversamos e fiquei sabendo que o suíço já havia viajado toda a África e agora estava explorando as Américas.  Falamos muito de moto e que o meu problema era usar uma moto que usa câmaras nos pneu, já a sua BMW não usa, então não tem esse problema. Concordo com ele, mas não tenho nem o capital nem o porte físico necessários para andar de BMW por aí. Fim de papo. Confesso que estava muito cansado para ficar de papo após o jantar e me recolhi logo, também a agenda para o outro dia começaria cedo.